ARTIGOS

“Por que os economistas às vezes erram”, por Antônio Augusto Ribeiro Brandão

gettyimages-509051302-e1558717792428

Os economistas pertencem a diversas Escolas de pensamento e a outros tantos padrões de qualificação: ora são clássicos, neoclássicos, keynesianos e pós-keynesianos; ora são monetaristas, marginalistas, estruturalistas, ortodoxos, heterodoxos e liberais. E ainda estão ligados a questões ideológicas.

São professores, profissionais liberais, membros de associações e de corporações; ocupam cargos e prestam seus serviços aos setores público e privado da economia, principalmente aos governos e ao sistema financeiro.

Nos últimos tempos tenho escrito sobre muitos assuntos ligados à economia. Externei e alimentei grandes esperanças sobre o novo governo americano, porém, logo em seguida, tive que tentar explicar a famosa ”˜crise da bolha”™, ainda repercutindo no mundo inteiro; dei, também, alguns palpites sobre a economia brasileira em face dessa crise, apesar do então decantado aparecimento de uma nova classe média alimentada por transferências de renda e concessão de crédito.

Não pude resistir à tentação de voltar a escrever sobre economia ao ler o artigo ”˜A academia não previu a crise”™, de Raghuram Rajan, professor de Finanças da Booth School of Business, da University of Chicago, texto publicado no jornal ”˜Valor Econômico”™.

Uma outra matéria ”˜O barraco dos doutores”™, (revista Época, edição de 14/10/19), tem um trecho que diz: “Os tempos mudaram, mas o embate continua entre economistas ortodoxos – alguns deles liberais e heterodoxos ligados a partidos de esquerda”?, a propósito de questões ligadas à operacionalização do ”˜teto”™ de gastos estabelecidos pelo governo federal.

A Economia é menos ciência e mais arte, pois todo arcabouço teórico está disponível, mas depende da maestria de quem o utiliza e já foi chamada de ”˜economia política”™ havendo quem advogasse seu retorno. Há muito caíram por terra as teorias dos mercados perfeitos, ”˜livres e irrestritos”™, incapazes de permitir algo de errado, e de que os consumidores agem racionalmente ao tomar suas decisões; além do mais, sempre haverá economistas ligados a governos e empresas, direta ou indiretamente, porém o comportamento ético desses profissionais deve ser considerado ponto pacífico.

A crise no mercado imobiliário americano foi gerada no ventre do seu próprio sistema: grandemente alavancado pelos financiamentos aos mutuários e estes estimulados pelas vantagens oferecidas, esse sistema gerou hipotecas negociadas no mercado secundário dos bancos de investimento. Daí por diante foi só papel gerando papel, moeda fiduciária; bastou que os mutuários não pagassem as prestações da sua tão sonhada casa própria, para a crise instalar-se em ondas sucessivas.

O resultado disso tudo todos nós sabemos. O Tesouro americano, via o Federal Reserve (FED), o banco central americano, despejou trilhões de dólares no mercado, estatizando bancos ou simplesmente livrando-os da falência, procedimento mais ou menos adotado pelos bancos centrais das economias desenvolvidas; como na crise de 1929 não houve essas ”˜salvaguardas”™, aconteceu a quebradeira geral.

Há um trecho no artigo do professor Rajan, que diz: “[…] poderíamos ter compreendido por que alguns políticos americanos encorajaram o setor privado a financiar residências acessíveis, enquanto outros desregulamentavam as finanças privadas […]”?, mas ele mesmo admite não ter havido advertências nesse sentido.

Sabemos que o Brasil já viveu uma grande expansão no setor imobiliário, gerador de emprego e renda, contudo, como os americanos, não tivemos os cuidados devidos, para evitar o que aconteceu por lá também acontecesse por aqui. Os preços dos imóveis, naquela conjuntura, estavam subindo e ninguém acreditava, em sã consciência, que pudessem vir a cair um dia, mas foi o que aconteceu lá.

Dizem que economistas mais ou menos fatalistas costumam errar nas suas previsões, contudo prestam mais atenção quando os fundamentos econômicos estão se deteriorando, e alertam o mercado; há outros mais liberais que não ligam muito e até justificam certas práticas, como a de socorrer bancos claramente caminhando para a insolvência. A verdade é que os economistas precisam ser ajudados pelos contadores e auditores, que devem velar pelos ”˜princípios contábeis geralmente aceitos”™; os balanços e demais demonstrações financeiras apresentadas à análise precisam estar consistentes e transparentes.

O professor Raghuram argumenta que três fatores explicam nossas dificuldades: “especialização, a dificuldade de se fazer previsões e o descolamento entre boa parte da profissão e o mundo real”?, e que os economistas precisam ser cada vez mais generalistas, entendendo tanto de macro quanto de microeconomia, concluindo: “[…] o verdadeiro motivo pelo quais os economistas deixaram de prever a crise poderia ser bem mais mundano […], simplesmente não estavam prestando atenção”?.

A Academia continua mais preocupada com o curto prazo das suas teses do que em fazer previsões; deveria estar mais interessada em descobrir, por exemplo, como países podem crescer independentes do regime de governo ou de quem os governa, para que a renda gerada possa ser bem distribuída ao “alívio da pobreza mundial”?.

Essas são preocupações recentes do economista francês Thomas Piketty e de seus colegas ganhadores do Prêmio Nobel de Economia deste ano: Esther Duflo, Michael Kremer e Abhijit Banerjee.

jhgf

Antônio Augusto Ribeiro Brandão é economista

Palavras-chave :

Compartilhar :