Como será o amanhã?
Por: José Cursino Raposo Moreira – Economista.
A pergunta acima, título do samba do compositor João Sérgio que fez muito sucesso na voz da cantora baiana Simone e de outros artistas, é muito pertinente ao atual momento brasileiro, às vésperas das eleições de outubro. E a sua resposta, dada nas primeiras estrofes da letra da música, parecem também apropriadas ao cenário que se delineia para o país a partir de janeiro de 2023. Afinal, diz o poeta “Responda quem puder, o que irá me acontecer, o meu destino será como Deus quiser”.
O país e principalmente o governo comemoram a taxa de inflação negativa no mês de julho, quando o IPCA apresentou queda de 0,68%, depois que havia sido de 0,67% em junho. Para maior felicidade ainda, esta queda é a maior do IPCA desde que ele foi criado em 1980 e ainda é possível que venha a ser negativo de novo em agosto, cujo resultado será divulgado em setembro, faltando menos de um mês para as eleições. A diminuição bem vinda diante de uma persistente inflação que está acima de 10% no acumulado de 12 meses desde setembro de 2021 se deveu, sobretudo, às reduções dos preços de 3 produtos: gasolina, etanol e energia elétrica residencial, cujos encolhimentos no mês foram respectivamente de 15,48%, 11,38% e 5,78%.
A explicação para quedas tão expressivas em preços de produtos de tanta importância é a fixação de um teto na cobrança do ICMS incidente sobre alguns produtos e serviços, dentre os quais estes, estabelecida por projeto de lei sancionado no mês de junho, em percentuais bem inferiores aos que vinham sendo praticados pelos estados, que têm neste tributo sua principal fonte de arrecadação.
E aí então é Billy Branco, outro sambista brasileiro de grande sucesso, quem pode falar da situação, com o seu grande sucesso “O que dá para rir, dá para chorar”, pois que esse nível de impostos mais baixo, arrancados do Congresso às custas de muito “orçamento secreto”, só vigora até 31.12 deste ano. Isto é: a partir de 1º de janeiro as alíquotas do ICMS podem voltar aos patamares anteriores, visto que os estados alegam que a medida lhes causou significativa queda de receita. Então o motivo da alegria de hoje pode ser a razão da lágrima de amanhã, já que os preços dos combustíveis voltariam aos níveis anteriores e mais elevados.
Além disso, a chamada PEC KAMIKASE ou das “bondades” ou “das eleições”, no bilionário valor de R$41,2 bilhões, associada a cortes de impostos sobre produtos industriais e de outros tributos federais, também recentemente aceita pelo Congresso, constitui outra fonte de tensão para 2023, pois agrava a já complicada situação das contas públicas. Como uma situação fiscal de desequilíbrio provoca inflação e esta é combatida com elevação da taxa de juros, também no campo monetário há potenciais fontes de piora do cenário no próximo ano. A Taxa Selic desde o ano passado já sofreu 12 elevações consecutivas, passando de 2%, patamar em que se encontrava no início de 2021, para os atuais 13,75%, sendo bastante provável que ainda sofra novo reajuste na próxima reunião do COPOM, quando então chegaria a 14,25%, taxa que vigorou no final do governo de Dilma Rousseff.
Com taxas de juros tão altas o consumo e o investimento tendem a arrefecer e a perspectiva que se delineia é a de menor taxa de crescimento do PIB em 2023, anulando-se assim a provável taxa positiva de 2022. Apesar dessa possibilidade, as projeções até agora delineadas para 2023 em termos da inflação continuam apontando para estouro do teto da meta, previsto em 5%, tendo por centro a taxa de 3,25%.
Mas a própria inflação de 2022, que apresentou a boa notícia de deflação em julho, também persiste em níveis bastante elevados no grupo de alimentos, tendo este crescido em 1,30% no mês, aproximando-se de 15% no acumulado de 12 meses. Só o Leite Longa Vida, por exemplo, subiu 25,46% em julho, depois de haver crescido 10,72% em junho. Além disso, a sua projeção para 2022 se encontra em 7,11%, ante a fixação de 3,50% para o centro da meta e de 5,25% para o teto.
Vê-se assim que vão se delineando um hoje e um amanhã muito preocupantes para os brasileiros, em meio a uma das mais polarizadas e imprevisíveis eleições desde o fim do regime militar .