ARTIGOS

A Economia em “estado de choque”.

A Economia em “estado de choque”.

Por: José Cursino Raposo Moreira, Economista.

A questão dos preços dos itens da matriz energética do país, como os combustíveis automotivos, o gás de cozinha, a própria energia elétrica e de serviços que os utilizam como insumos, a exemplo do transporte de cargas e de passageiros, continua provocando “choques” na economia brasileira. É verdade que a guerra entre Ucrânia e Rússia constitui um fator externo causal de tais ocorrências, mas há forte grau de contribuição “genuinamente nacional” para o “estado de choque” em que a economia brasileira se encontra.

No que diz respeito às causas internas, se entrelaçam a política de preços dos combustíveis dos derivados do petróleo adotada pela Petrobras desde 2016, as eleições para Presidente da República no próximo dia 2 de outubro do corrente ano, a sempre desejada e não realizada reforma tributária e até os prognósticos sobre como se posicionará o Brasil quanto ao espaço futuro que dará em sua atividade produtiva aos combustíveis fósseis e como serão suas relações com o meio ambiente. Como se vê, uma situação nada trivial.

A preocupação imediata do presidente Bolsonaro são os estragos eleitorais que os constantes aumentos dos preços da gasolina, óleo diesel e gás de cozinha provocam ao seu projeto de reeleição. Em razão de tais circunstâncias, já demitiu, em pouco mais de 90 dias, dois presidentes da Petrobras e agora se vale da oportunidade que o processo de troca do último titular que ejetou do cargo exige para conseguir um “congelamento” nos preços dos produtos que a companhia comercializa, em torno de 60 dias.

A última medida tomada e que provocará mais problemas que soluções na questão é o projeto de lei do Executivo, aprovado pela Câmara dos Deputados, no dia 25 de maio, que impõe um teto de 17 % a 18% à alíquota do ICMS incidente sobre os combustíveis, energia e transporte público. Apesar de estimativas de que ele teria a capacidade de reduzir em até 1,5 ponto percentual a inflação, por conta da redução dos preços dos combustíveis que proporcionaria, a medida não é de tranquila aceitação pelas perdas de arrecadação que impõe a estados e municípios. Além disso, é também desaconselhada pela “contaminação” que provoca nas discussões da reforma tributária, ao utilizar-se de um tributo estadual como uma medida de inspiração casuística e destinada a enfrentar um problema passageiro, enquanto ela, a reforma tributária, é de natureza permanente.

No caso da perdas de arrecadação, os secretários estaduais de fazenda estimam que elas totalizem até R$ 80 bilhões. Contudo, o ponto mais sensível são as contas relativas às reduções específicas na Educação, já que a medida vai diretamente subtrair recursos do FUNDEB, a principal fonte de financiamento desta política, sobretudo para os municípios. As cifras apresentadas até agora apontam para uma diminuição de recursos de R$ 19 bilhões para a educação, em 2022, além do impacto sobre as demais políticas públicas financiadas com o ICMS. A avaliação dos especialistas da área é que houve uma escolha por subsidiar um combustível poluente em detrimento de uma política social, “trocando-se a educação das crianças por gasolina mais barata”. Nada mais desalinhado com os conceitos de sustentabilidade que isto.

Nesse “choque de interesses”, são lançados “balões de ensaio”, ora testando-se as reações a hipotética mudança da política de preços da companhia, emparelhados com o mercado internacional, que vigora desde 2016, ora até anunciando-se a possibilidade de privatização da Petrobras. São movimentos divergentes e assim desorientadores dos agentes que atuam no setor.

O que fica, portanto, claro, diante da complexidade de temas, interesses e protagonistas envolvidos na questão, é que a situação presente não terá evolução consistente, até a realização das eleições de outubro, salvo nas circunstâncias em que o Presidente Bolsonaro possa livremente “usar sua caneta”, como tem feito nas demissões em série de dirigentes da área de Minas e Energia, ocorridas desde o começo deste ano.

Palavras-chave :

José Cursino Raposo Moreira., Macroeconomia

Compartilhar :